Title: Versos em honra do grande poeta Manoel Maria Barbosa du Bocage
Author: Elisino Sadão
Release date: September 16, 2007 [eBook #22634]
Language: Portuguese
Original publication: , 1905
Credits: Produced by Vasco Salgado
Produced by Vasco Salgado
em honra do GRANDE POETA
+Manoel Maria Barbosa du Bocage+
e em homenagem á grande e illustre Commissão e mais festeiros do seu estrondoso Centenario
+Manoel Maria Barbosa du Bocage+
+Imprecação a Bocage+
Fostes, Elmano, um lyrico famoso
Como poucos por cá têm apparecido,
Mas quando sois maior, e mais luzido,
É quando a satyra soltaes fogoso.
É latego que estala rancoroso,
Ou ri e brinca, com valor brandido,
E vibra e rasga, e que se impõe temido
Ao inimigo mais formidoloso.
Dae-me essa força, Elmano, o estro candente,
Dae-me tambem o guisalhar da troça
Com que soubeste castigar contente!…
Quero coisa feraz que faça móssa,
Que ha por hi muita cousa e muita gente
Que reclamam, ha muito, brava coça!
+A sua desgraça+
Não lhe bastava a crúa e acerba sorte
Que sempre o grande vate perseguiu,
Sempre a empurrá-lo a um fatal desvio
Da cova ao berço, do nascer á morte?
Esfarrapado rei em sua Côrte,
Quasi sem roupa muita vez se viu;
Depois de morto expõem-no á chuva e ao frio
Em estatua tosca e de medonho córte!
Como preito já velho, honroso, e ufano,
A um jornal pulha dão seu nome (Elmano).
Quebram-lhe a penna as pedras dos garotos…
Lavam-no (agora!) a bombeiral esguicho,
E o livro (que não leram!) cheio de lixo,
E o pedestal mijado por marotos…
+Depois da conferencia do dr. Manuel de Arriaga+
Conheciam-no só p'lo vão renome:
D'aquella esguia estatua (que é grotesca)!
Ou d'um antigo galeão de pesca
Que se condecorava com seu nome.
Outros d'um theatro que morreu de fome
Depois d'uma existencia principesca,
E muitos da anedocta picaresca…
Que ainda ha quem a sério não o tome…
Agora que é sabido o que elle foi…
Inda o 18 (esperto e audaz heroe)
É capaz de o metter no cagarrão.
O que o livra do estranho desacato
É o Teixeira (que apanhou retrato…)
Sêr o Macaco lá da commissão!
+A consultar os astros+
O Presidente que é um homem sério
E que é de letras gordas, mas facundo,
Vae deslumbrar a terra, a patria, o mundo,
Com um discurso pleno de podério.
Andam da inspiração no grave imperio
O Brandãosinho, lyrico profundo,
E o Leonardo, de genio furibundo,
Que só de ouvir-lhe a voz treme o hemispherio.
O Jorge Gomes e outros luminares,
João Pinto, Luciano, andam nos ares
Como o Padilha interrogando estrellas…
Sonham foguetes, córos, reinações,
Mas tremem de pavor e em orações
Rogam ao Deus das chuvas e procellas…
+Pede-se um Bocage para a associação dos caixeiros+
Zé Paulo, que é rapaz escrupuloso,
Diz que não quer apresentar retrato
Ou seja bom ou mau, caro ou barato,
Nas festas que prepara cuidadoso.
Cousa menos que um busto é desacato!…
«Um busto em corpo inteiro!» grita ancioso…
E vae, falla a um gallego talentoso
Para servir de Elmano com recato.
Para fazer de Poeta, outro Poeta!
Tem você alli um, no campo, á Lage…
Mas consta já, por fim, (ou será peta)?
Já estar o Augusto Mattos contractado
Para fazer de busto de Bocage,
Em REPRISE de entrudo, enfarinhado.
Pobre Zé Agostinho! Infeliz sorte
A que Deus dá sempre aos que são maiores!
Olha para Bocage e outros cantôres…
Ao menos que esta ideia te conforte!
Ha destinos mais brutos que Mavorte,
Que o Deus Mavorte de crueis furores;
Nos calculos mais certos, sem favores,
O Fado surge e arruma cerce córte.
O Augusto reclamou-o o Tiro-Tauro,
E com razão, porque o feroz centauro…
De paparoca, á festa tambem vem.
Tens outro, á certa, e bom, (já é quisilia!…)
Tens o Bocage Lima: é da familia,
E, embora gago, representa bem.
+Projecto d'um carro monumental+
Na azafama de carros allegoricos
É natural que falhe a fantazia,
Por isso eu vou dizer o que faria,
E vejo em meus ideaes fantasmagoricos.
Da commissão o carro comporia
Com elementos proprios, e rhetoricos,
De effeitos mais que certos e fosforicos!
Que o gosto mais audaz desbancaria.
N'uma galera, entre «ondas salitrosas»
Os secretarios, toda a Commissão,
Feitos Nereydas, Tágides dengosas…
Tridente em riste na escamosa mão,
Barbudo e em pelo, olhando as salerosas,
O Fragoso faria de Tritão.
+A festeiros diversos+
Festejam-no vossês porque está morto…
Fosse Elle vivo, quanto o morderiam!
Frades e hypocritas o que fariam
Ao seu magro canelo rijo e torto!
Gabam-lhe o nome com um ar absorto,
Mas quanto a lê-lo, adeus!… Olhem que o liam
Os ferozes maniques que o prendiam
Como suspeito e perigoso aborto.
Festejam-no vossês que nunca o lêram
(E se o lêram alfim não o entenderam!)
Festejam-no por bródio e funcçanatas…
Gastem dinheiro seu: comprem-lhe a obra,
Que tão rica e tão vária se desdobra…
Não vale só frigir, oh pataratas!
+Consolação final+
Não choreis, terra minha, a desventura
Da perda do Bocage genial,
Já sem ossos, sem cinza, e sepultura,
Mais do que o vivos vive, é immortal!
Rir não deveis tambem pela ventura
De seres o seu berço casual;
Rires demais tambem será loucura.
Moderai-vos na furia festival.
Temos por cá ainda muito vate,
E o genio authentico do Calafate,
Que reclamem festejos e alegria…
Temos genios em barda, e (sem biscate)
Temos tambem, para maior remate,
Temos cá outro Manuel Maria.